Crianças superdotadas de desenvolvimento tardio

Crianças superdotadas

de desenvolvimento tardio

* Neste mês das crianças, trazemos para você versão em português do texto da psicóloga Dra. Gail Post,
publicado originalmente em inglês, em março de 2019, no blog “Gifted Challenges”

Uma suposição comum sobre crianças superdotadas é que elas alcançam marcos com bastante antecedência. Elas escalam as paredes do berço antes mesmo de aprenderem a andar. Elas leem aos dois anos de idade. Elas resolvem equações algébricas antes mesmo de amarrar os sapatos. Relatos surpreendentes de talento precoce estabelecem um padrão elevado… e criam a impressão de que todos os indicadores de superdotação surgem na infância.

Mas algumas crianças superdotadas têm desenvolvimento tardio.

Embora dificilmente seja um termo técnico ou diagnóstico, “desenvolvimento tardio” caracteriza crianças superdotadas que dominam marcos intelectuais, de desenvolvimento ou socioemocionais mais tarde do que o esperado. Embora frequentemente demonstrem alguns sinais precoces de superdotação – fala precoce, sensibilidade aguçada ou curiosidade insaciável – às vezes, nada de notavelmente superdotado pode ser aparente. Na verdade, algumas crianças superdotadas podem até apresentar “atraso” no desenvolvimento. Elas podem ter início tardio na fala (como Einstein), demonstrar pouco interesse em leitura ou preferir brincar a se envolver em qualquer atividade remotamente acadêmica.

Comentários sobre crianças superdotadas com desenvolvimento tardio incluem os seguintes:

“Ele constrói essas estruturas incríveis de Lego e consegue se concentrar nelas por horas, mas não tem interesse em ler. Ele parece bem inteligente, mas se não sabe ler antes de começar o jardim de infância, acho que não pode ser um superdotado.”
“Ela é muito intensa e fala cedo, e parece curiosa sobre muitas coisas. No entanto, ela tem pouco interesse em brincar com as outras crianças da pré-escola e prefere brincar sozinha. Ela parece imatura em comparação com as outras crianças, e nos preocupamos que ela pareça estar atrasada.”
“Ele falou muito pouco até os 2 anos e meio. Parecia ouvir atentamente e responder, mas não usava as palavras. Ele fala bastante agora que tem 5 anos, mas não tão fluentemente quanto alguns de seus amigos. Mas parece adorar matemática e ciências. Ele tem um conhecimento quase enciclopédico sobre dinossauros e resolve problemas de matemática de cabeça por diversão. Preocupo-me, porém, que ele não se saia bem na Educação Infantil, pois parece estar atrasado na fala e nas habilidades verbais.”

As crianças descritas acima apresentaram desenvolvimento normal, juntamente com habilidades avançadas em certas áreas. Seus pais, no entanto, viam esse desenvolvimento normal como “atrasado”, seja porque era insignificante em comparação com os pontos fortes de seus filhos, seja porque não correspondia às habilidades observadas entre os colegas de seus filhos. A superdotação não era sua preocupação; eles estavam preocupados, em vez disso, com sérios atrasos no desenvolvimento e até mesmo se seus filhos seriam capazes de se adaptar às classes do seu nível. Esses medos são típicos entre pais de crianças superdotadas que se desenvolvem tardiamente; a falta de um ponto de referência e a grande disparidade entre as habilidades dificultam a avaliação do potencial de seus filhos. Pode ser difícil compreender que o ritmo e a maturação de seus filhos estão em um curso diferente do que observam em crianças neurotípicas (ou que aprendem em “manuais de parentalidade”).

Quem é o típico talentoso que se desenvolve tardiamente?

O desenvolvimento assíncrono, onde pode haver uma “incompatibilidade” entre habilidades, é comum entre superdotados que se desenvolvem tardiamente. A maturidade social pode se desenvolver em um ritmo mais lento, enquanto as forças intelectuais superam as de seus colegas de classe, afetando sua capacidade de encontrar colegas com ideias semelhantes. Outras vezes, várias habilidades e capacidades podem ficar para trás, como o desenvolvimento motor fino ou a fala. Crianças duplamente excepcionais apresentam vários desafios, dificuldades ou deficiências. Algumas delas podem ser superadas (como nos exemplos de déficits de fala ou de habilidade motora fina). Outros podem ser permanentes (por exemplo, transtorno do espectro autista ou TDAH), embora haja alguma controvérsia sugerindo um excesso de diagnóstico desses transtornos. Assim como crianças neurotípicas de desenvolvimento tardio, superdotados que se desenvolvem tardiamente podem precisar de tempo para “florescer” e seus “atrasos” podem se estabilizar.

O que você deve fazer se seu filho ou sua filha superdotada se desenvolver tardiamente?

1. Informe-se e tente ganhar alguma perspectiva. Reúna informações sobre o desenvolvimento infantil de crianças neurotípicas, duplamente excepcionais e superdotadas.

2. Busque apoio, mas seja seletiva sobre a quem você pede ajuda. Familiares, amigos, professores, pediatras, conselheiros, treinadores, babás — todos podem ter experiência com crianças superdotadas, neurotípicas ou até mesmo com “progresso normal”. No entanto, muitos podem interpretar mal ou julgar mal os superdotados que se desenvolvem “tardiamente”. Você pode ser inundado com sugestões e críticas sobre tudo, desde sua perspicácia parental até a trajetória profissional do seu filho de três anos. Fóruns online sobre superdotados também apresentam alguns dilemas — às vezes, os participantes podem ser bastante solidários; outras vezes, ler sobre crianças superdotadas pode desencadear seus piores medos.

Tenha cautela ao buscar conselhos e desconsidere informações que sejam prejudiciais, contraproducentes ou que simplesmente não pareçam adequadas para seu filho. Às vezes, você pode responder educadamente e escapar da interação. Outras vezes, comentários insensíveis justificam um contra-argumento, e certamente é apropriado apontar como seu filho difere do que a pessoa pode estar insinuando. Encontre amigos e educadores/profissionais de saúde que conheçam a superdotação em todas as suas variações, peculiaridades e assincronias.

3. Procure ajuda para seu filho quando necessário. Às vezes, a intervenção precoce é benéfica. Embora a maioria dos “atrasos” se nivele, alguma ajuda ao longo do caminho pode reduzir o estresse para seu filho e sua família. Terapia fonoaudiológica, ocupacional ou fisioterapia podem ser cruciais desde cedo, quando há déficits. Treinamento de habilidades sociais ou até mesmo orientações simples sobre como lidar com interações sociais podem ajudar seu filho superdotado a navegar por relações confusas com seus colegas. Avaliações para deficiências ou dificuldades de saúde mental são essenciais se você tiver dúvidas ou preocupações – além de encontrar a escola, o tutor, o programa, o terapeuta, o especialista em educação ou o centro de tratamento certos.

4. Aceite seu filho. Respire fundo e aprecie a singularidade, as habilidades, as peculiaridades, a amabilidade e a natureza amorosa do seu filho. Reconheça que todos têm pontos fortes e fracos. Nenhum de nós progride uniformemente pela vida – todos temos altos e baixos, e às vezes isso inclui surtos de desenvolvimento e pequenos “atrasos”. Lembre-se de que o contraste marcante entre as habilidades excepcionalmente avançadas do seu filho superdotado e pequenos atrasos – ou mesmo o desenvolvimento normal – pode gerar ansiedade quando não for justificada.

O desenvolvimento da sua criança com altas habilidades e desenvolvimento tardio deve se equilibrar com o tempo. Lembre-se disso todos os dias. Se as dificuldades persistirem e o pediatra, professor ou psicólogo do seu filho suspeitar de um atraso significativo, procure uma avaliação com o profissional adequado. Isso pode exigir a expertise de um psicólogo escolar, neuropsicólogo, especialista em leitura, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional ou outro especialista. Quanto mais cedo você tiver clareza sobre quaisquer deficiências ou áreas que precisam de apoio, mais rapidamente quaisquer atrasos ou problemas serão resolvidos.

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